sexta-feira, 31 de julho de 2015

Capítulo 13. Décima Terceira Garota.


   Ashe parece ter cochilado em meu colo, quanto tempo será que estou  presa aqui dentro ? Será que  Brian voltou com Margo? No dia que deveria ser o meu funeral eles estavam juntos... Acho que ela deve ter dado uma segunda chance a ele. Ouço o barulho do motor de um carro pesado, sacudo Ashe para que ela acorde.

- Ashe - A vejo abrir os olhinhos lentamente - Você sabe onde fica o buraco que Luana disse ? - Ashe balança a cabeça e aponta para a lixeira, coloco-a com cuidado no chão e corro para  o lado da lixeira, olho para Ágata, ela parece entretida correndo atrás das menores, puxo o container de metal enferrujado para o lado e me enfio na fenda entre ele e a parede, vejo um buraquinho do tamanho de uma moeda, encosto meu rosto sobre o muro e tento espiar lá fora. Não tem casas ou prédios abandonados, apenas uma grande estrada e um matagal muito alto, de repente um caminhão de porte baixo aparece, verde escuro, com três rodas bem grossas. Levanto-me, arrumo a lixeira e volto pro lado de Ashe. Vanilly disse que os caminhões só aparecem quando trazem uma garota ou quando levam a "mercadoria". Acho que terá alguém nos esperando quando entrarmos. 

  O sol se esconde, e assim como ele está na hora de nos escondermos também, Ágata nos manda formar uma fila e seguir em direção ao corredor, está tudo escuro, mais escuro que o habitual, mas surpreendentemente ou milagrosamente, uma luz fraca vem da porta do final corredor, quando entro vejo um fio pendurado do telhado e uma luz fraca está balançando. Ao lado da parede com a pequena janela que eu, Ashe e Miranda costumávamos dormir, está uma moça muito grande, maior que Érica.

- Ela parece uma montanha -  Fala Ashe me olhando aterrorizada, a moça em questão está de pé de braços cruzados, seu rosto está muito machucado e sangrando, ela é alta assim como Érica, tem cabelos castanho claro, e é obesa, ela lança um olhar de nojo para nós e nos dá as costas. A porta bate a nossas costas, Érica vai até a recém chegada. Miranda puxa seu braço e cochicha algo, ela assente e para onde a luz está pendurada . Érica pigarreia, mas a moça continua de costas, outro barulho com a garganta, nem um sinal da nova hóspede. 

-  Olha é o seguinte, seja lá quem você for nós não ligamos, mas preciso saber se você tem algum tipo de doença. 

- Tá com medo de pegar alguma doença venérea enquanto me estupra machão ? 

- Eu não encostaria a mão em você nem se estivesse com a vida em risco, você é uma carcaça, uma nada, assim como nós, a diferença e que quero que fique distante. - A moça vira para onde Érica está e vai até ela, elas estão cara a cara. 

- Onde você colocou seus sapatos ? - pergunta Vanilly baixinho, deixei de usar os sapatos aqui dentro, optei por ficar apenas de meias, minha coluna estava doendo, minhas pernas estavam cansadas. 

- Próximo a janela - Respondo baixinho. Furtivamente, Vanilly e Ellie, a  moça com pele morena e cabelos lisos, vão até onde deixei meus sapatos, cada uma segura um par e vão ficar ao lado de Érica. 

- Então você se acha melhor que eu sua machão ? 


- E uma coisa bastante óbvia botijão de gás gigante. 

- Pelo menos, eu sei me virar sozinha, não preciso de duas ratas com sapatos pra me protegerem - Érica olha para trás, Vanilly e Ellie estão lá, encarando a moça de TPM. - Vocês são tão ridículas que chegam a ser engraçadas - A Moça vira para onde eu e o restante do grupo estávamos - Wont, temos criancinhas aqui, elas já sabem que vão virar prostitutas pelo resto da vida ?

- Elas certamente serão vendidas para alguma família que não possam ter filhos, ou mulheres divorciadas ou... 

- Ou papais do malvados que vão estuprá-las pelo resto da vida. 

- CALA A BOCA VADIA - Érica grita - EU NÃO QUERO QUE VOCÊ DIGA ESSAS COISAS PERTO DELAS! Se você é um ser humano desprezível que teve a infância roubada isso não é problema nosso, mas essas garotas já estão aterrorizadas de mais para que você enfie mais merda na cabeça delas, e eu não vou deixar você puxá-las pro poço da amargura onde você tá se afogando  - A moça olha para as menores, Ashe esconde o rosto em minha cintura, as outras olham para baixo, sim elas estão com medo dessa mulher, todas nós estamos, mas ela é o último pedaço que faltava para que possamos fugir. 

   Ashe,  Miranda e eu ficamos junto com as outras garotas hoje a noite. 


- Você acha que ela pode... Você  sabe, mexer em alguma de nós enquanto dormimos ? - Miranda me pergunta, é claro que ela está com medo, eu também estou, do outro lado do cômodo uma moça enorme nos encara como se fôssemos sua próxima refeição. 

- Se ela tentar alguma coisa, tenho certeza de que Érica e seu esquadrão vão utilizar as armas - Vanilly e Ellie continuam com meus sapatos, elas parecem caçadoras esperando a hora de atacar. 

- Não consigo dormir Luz. 

- Nem eu. - Olho para o telhado,  não faz muito tempo desde que entramos, as pequenas estão cansadas, e as maiores aterrorizadas de mais para pregar o olho. De repente a porta começa afazer barulhos, Érica olha para mim com os olhos arregalados, chegou a hora, ela fala baixinho, meu estômago começa a ficar com frio, estou nervosa, estou ansiosa, precisamos que isso dê certo. 

     Ellie e Vanessa começam a acordar as pequenas, Monstro  e outros dois caras vestidos de negro e usando uma toca sobre o rosto, onde tinham furos apenas para os olhos, nariz e boca 

  -  Levantem Monstros, está na hora de conhecer seu novo lar - Os homens de toca vão em direção a recém chegada, Monstro nos manda fazer uma fila indiana e o seguirmos pelo corredor. Fazemos o mesmo trajeto que estávamos acostumadas, mas dessa vez quando entramos no refeitório, uma porta está aberta do outro lado, passamos por outro corredor escuro, vejo fachos de luzes fracas por trás das portas que passamos, conto oito apenas no lado esquerdo, levanto a cabeça, existem portas dos dois lados do corredor, dezesseis portas ao total, diversas garotas esperando para serem vendidas. Chegamos ao que deveria ser a recepção do hospital. Portas de vidro quebradas, foram reforçadas com portões de ferro, um caminhão baú nos espera com a carroceria aberta, dois homens armados estão nos dois lados da entrada, a cor verde escuro parece preto a noite, estrategicamente camuflado.  

     Ana é a primeira a subir na rampa e entrar no caminhão, seguida por Luana, Amanda, Samanta, Bárbara e Ashe que é a última das menores, em seguida vem Érica, Vanilly, Ellie, Miranda, Vanessa, eu, por último a nova garota. Tem dois grandes bancos de madeira, um de frente para o outro, a moça recém chegada senta de frente para mim, eles fecham a carroceria e nós ficamos no escuro total. 

   O caminhão dá partida e meu coração começa a disparar, conto até trezentos duas vezes, antes de chamar por Érica.

- Érica está na hora.

- Levantem-se todas - Érica ordena, todas as meninas se levantam, ela pega o banco o qual estávamos sentadas e encosta na parede do caminhão, quando vamos pegar o outro banco, ele não se move, Ela ainda está sentada. 

- LEVANTA CARALHO - Vanilly grita - É a nossa única e última chance de fugir e você não vai estragar isso. Ela se levanta e puxamos o banco, como o combinado, vamos todas para o lado que Ela está. Por ser maior e mais pesada com certeza vai dar  um bom embalo. Pegamos impulso e corremos para a frente com força, as pequenas estão amando fazer isso, para elas é uma brincadeira, para nós é uma tentativa de mudar nosso futuro. Corremos de novo e de novo, o caminhão balança, Ela percebe o que estamos fazendo e se junta ao grupo, correndo da esquerda para direita fazendo a carroceria balançar, apenas um pneu dianteiro e a carroceria balançando. 

- Se choquem com força dessa vez - Ela grita e nós fazemos, a vejo se jogar com tudo sobre a carroceria do caminhão e faço o mesmo, mais um embalo e sentimos o caminhão vacilar, sinto o som da risada das meninas menores.

- Continuem!! - Grito - Usem toda a força que puderem e assim que ele tombar preparem-se para correr. - Volto para o lado de Miranda, e concentro toda  minha força no meu ombro, todas fazem isso e sentimos a gravidade nos arrastar para o lado esquerdo, tudo fica lento e tenho a ligeira impressão de estar voando até que minhas costas batem com força, ouço os gritos das minhas companheiras, vejo o chão subir e se tornar o teto, meu corpo parece  uma bolinha dentro de uma caixa gigante que está sendo sacudia.  

 -  Levantem! Levantem agora! - A moça grita - Me ajuda com o banco rápido - Érica e Vanilly pegam o  banco e as três o empurram contra a porta, forço-me a levantar, ajudo Miranda e mando Ashe ficar por perto, Ellie se junta a nós e empurramos o pedaço de madeira contra a porta, com força, com mais força, mais uma vez, a porta amaça mas não cede, continuamos  até que um último golpe em sicronia com as outras faça a porta se romper. 

   Seguro com força a mão de Ashe e de Miranda,  saímos em disparada de dentro do caminhão, entramos no mato e as outras meninas nos seguem. O motorista do caminhão não saiu atrás de nós, ele nem mesmo saiu de dentro da cabine que ele estava. Continuamos a correr, quanto mais distante das estradas mais seguro será, mas não demorará muito para sentirem falta do caminhão, continuamos correndo e entrando cada vez mais no mato.    

   
     Sigo em direção da estrada, o oposto do hospital, minhas meias se enchem de espinhos mas não paro, meus pés começam a doer mas não posso perder o ritmo, seguro a mão de Ashe com força, Miranda corre no mesmo desespero que eu.

- Pra onde estamos indo ? - Pergunta Ellie não respondo, só continuo correndo, a mão de Ashe escorrega e ela cai. As meninas nos ultrapassam, levanto-a e a coloco nos braços, Ela é a mais lenta do grupo mas não perde o ritmo, o medo nos faz correr mais rápido, corro atrás delas, o mato começa a ficar mais denso, e eu mais lenta, as meninas param e se amontoam a alguns metros a  frente. 

- E agora ? - Pergunta Vanilly, está arfando, como todas nós.

- Precisamos encontrar uma cidade, um telefone, precisamos descobrir onde estamos e precisamos chamar o GOECTI - Fala Érica

-  Se formos para a cidade eles nos pegarão. - Avisa Vanessa.

- Se ficarmos aqui no meio do mato sem ninguém saber que existimos, ai sim eles nos pegarão, precisamos encontrar alguém - Retruca Ellie.

- Precisamos de um telefone - Digo chamando atenção, coloco Ashe no chão e encaro Érica. - Quando eu cheguei, você perguntou se eu era rica, e eu disse que não. Você perguntou qual era meu nome e eu disse que me chamava Luz. Mas eu menti, menti o tempo todo porque estava com medo. - Todas me encaram o medo se mistura descrença. 

- Então você é rica - Diz Vanilly 

- Sou - Olho para Ashe, ela segura minha mão e a aperta com força. 

- Qual é o seu verdadeiro nome então ? - Achei que Érica fosse me perguntar, ou começasse a gritar, ao invés disso disso Miranda me olha com amargura. Solto o coque, meu cabelo sujo, ensebado, amassado e desgrenhado toma conta das minhas costas e chegam a meus cotovelos.  

- Eu me chamo Aurora Richards, sou filha de Heloise Richards e nos precisamos chamar a minha tia Sara. 

terça-feira, 28 de julho de 2015

12. Não Fique Triste Preciosa Borboleta.

   
    
      Estou em choque. A minha frente está Érica sentada de frente para mim, e todas as meninas estão me olhando com um brilho diferente nos olhos. Esperança. Com o canto do olho vejo Ashe disfarçando o sorriso e encarando o chão, as menores estão fazendo o mesmo, as meninas maiores me olham sérias, mas estão felizes. O a possibilidade de conseguir fugir desse inferno parece um sonho, concentro-me na senhorita sentada a minha frente. 


 -  Bem, primeiro, você vai parar de me bater, se quiser falar comigo é melhor não me chutar, me socar ou me atirar coisas - Érica atirou uma pedra em mim ontem, quando estávamos no sol. 

- Feito. 

- Segundo, ainda não temos muito planejado, não sabemos de muitas coisas então fica um pouco difícil de se planejar algo quando não se sabe onde está pisando. 
 
- O que vocês pensaram até agora ? - Pergunta Vanily, ela se senta ao lado de Érica. 

- Usar o teto - Responde Miranda sentando ao meu lado.

- Como chegaremos lá em cima ? - Érica pergunta, está interessada e manter Ana segura, é um fato. 

- Luz disse que podemos subir umas nas outras, pisando nos ombros e quem conseguisse subir ajudaria quem estava em baixo. 

- E depois ? - Pergunta a mulata de cabelos lisos. 

- Correr seria o mais sensato. 

- Seu plano é falho. - Érica olha pra mim, e junta as sobrancelhas. - Estamos cercadas por um muro, com diversas  entradas com guaritas contendo pessoas armadas, eles vão disparar em qualquer um no raio de um quilômetro. Se nos virem no telhado vão atirar na gente. 


- Podemos sair com os caminhões. - Sugere a mulata. 

- Impossível. Assim que entrarmos nos caminhões vai ser o fim.

- Caminhões ? - Pergunto 

- Como acha que vão nos levar? Em algum carro de luxo ?

- Você disse que eles levam sempre que chegamos a treze, correto ? 

- Sim - Érica confirma

- Como sabe disso ? 

- Isso é um hospital antigo perto das fronteiras da cidade, repleto de salas, cada sala dessa é um cativeiro, quando eles chegam ao número treze levam pra vender. 

- Tem mais pessoas aqui dentro ? 

- Foi o que eu acabei de dizer. 

- Sabe quantas salas estão próximas ao número treze ?. 

- Apenas a nossa, estamos aqui a mais tempo, ouvi dizerem que seremos o próximo lote. 

- Alguém já viu algum desses caminhões ? - Pergunto. Ninguém responde, todas olham umas para as outras, nem uma palavra. 

- Eu já - Luana aparece - Eu Bárbara e Samanta estávamos sentadas na mesa e vimos algo na lixeira, ao lado dela tinha um buraco e eu coloquei meu olho para ver o que tinha do outro lado, um caminhão verde escuro passou, ele era pequeno e tinha três rodas. 

-Três rodas ? - Pergunto. 

-Sim.

- Caminhões não podem ter três rodas e impossível. 

- Na verdade - Vanily atrapalha - Caminhões de baixo porte que transportam carne tem apenas um roda traseira, eles são menores mas as rodas são grossas o bastante para suportar o peso.

- Uma roda traseira ? - Repito

- Isso - Concorda Luana. 

- Senhoritas, já sei como iremos fugir - Revelo sorrindo. 

    Os dias passam cada vez mais lentos, desde o incidente com Ana, Monstro parou de vir nos buscar de manhã, isso passou a ser uma tarefa de Ágata, a cada minuto que passava com ela, fui tendo cada vez mais certeza de que ela é completamente maluca, não que o fato de você sentar de frente para uma parede e começar a rir seja muito normal, mas ela assustava Ashe, e o resto das meninas menores, e me assustava também, ela segurava o coque que Vanily  fazia no cabelo e ria enquanto a machucava. As vezes, me perguntava como uma louca como Ágata, conseguiu se juntar a uma gangue de traficantes. 

       Outra noite, escutei alguns barulhos do outro lado da porta, todas as meninas estavam dormindo, me aproximei e reconheci os risos. Ágata ria descontroladamente e gritava nos corredores no meio da madrugada um arrepio passou por minha espinha e retornei pro meu cantinho próximo a parede e me forcei a fechar os olhos. 

   Estávamos no refeitório comendo a pasta que eles insistiam em chamar de comida, a TV estava ligada, e sempre que podia, roubava momentos do noticiário.        

    Aparentemente, as notícias sobre minha suposta morte estavam cansativas, minha suposta morte...   Mas por que não me mataram ? E por que Tio Roberth disse que encontrou meu corpo na lixeira de um restaurante ? Quem será a garota a quem ele encontrou ? Perguntas...  Perguntas...  É só isso que tenho, nem uma resposta.

   Se essa gente quisesse vingança pelo que meus pais fizeram com outras quadrilhas já teriam me matado, se eles quisessem dinheiro pelo resgate, certamente já teriam pedido, mas ninguém ia pagar nada por mim, já que eu já fui encontrada morta. Será que eles sabem quem eu sou ? Olho para Ágata, ela está parada na entrada da porta sustentado o sorriso macabro dela, hoje ela usa uma peruca de longos cabelos negros com franja, um vestido marrom escuro e sapatilhas rosas. Quando cheguei ela me chamou de preciosa e monstro chamou-me de alteza. Será que eles fazem ideia de quem ou sou ? Porque não me matam de uma vez ? 

"Tudo pode acontecer no mundo, o dinheiro e os bens dela ficarão para seus tios - Volto minha atenção para a TV novamente, estão falando dos meus tios, a jornalista divide a bancada com um senhor de meia idade de cabelos brancos, ela tem cabelos curtos e negros, eles  não se movem devido a quantidade exagerada de spray pra cabelo - Antes de morrer Aurora Richards assinou um seguro de vida, onde deixava todos os seus bens para os tios e a prima, as roupas que pertenciam a jovem serão leiloadas por sua prima Lauren Barniel no próximo fim de semana - A foto Lauren dando um sorriso amarelo e usando um vestidinho curto e preto com o cabelo solto aparece no fundo do cenário - O dinheiro arrecadado será enviado para instituições de caridade da cidade de Lori. Ainda não tem muitas informações dos sequestradores, o GOECTI está tentando rastrear essas pessoas com base no depoimento de Margo Banson que foi violentamente agredida e jogada em um barranco, a jovem conseguiu escapar devido a um equívoco de seus agressores que acharam que ela estava morta. 

- Interessada no jornal borboleta ? - Ágata pergunta em meu ouvindo me fazendo gritar - Ah, o que aconteceu ? Assustei você ? - Fico calada, ela continua me encarando e sorrindo, dentes amarelos, pele enrugada olhar psicopata - Não quer ver um pouco mais de jornal ? Oh, não quer correr pra perto da TV? Talvez Monstro goste de saber que você é ligeiramente interessada nas notícias - Encaro meu prato - Olhe para mim borboleta - Ágata puxa meu cabelo e levanta meu rosto - Não gosto quando não olha para mim, me sinto ignorada, agora me responde, porque gosta de ver o jornal? - Permaneço calada, olho nos olhos dela, não vou vou abrir a boca. Ela aperta meu cabelo e sacude minha cabeça, está doendo -  Me diz borboleta, por  que gosta de ver o jornal ? - Ela me encara sorrindo, é uma brincadeira e ela está gostando. - Você também gosta quando eu faço isso - Sinto seus dedos prendendo com mais força, ela balança com força e rápido, está doendo muito - Vai me dizer agora ? 

- Sou fã de Aurora Richards  - Disparo, ela solta meu cabelo e senta na mesa de frente para mim.

- Então você é fã da Aurora Richards ? - Ágata começa a rir mais, mais alto, mais escandaloso, mais sinistro, olho para o meu lado esquerdo, todas as meninas estão olhando, as menores estão chorando baixinho, estão com medo - Ela e fã de Aurora Richards - Diz encarando restante das meninas, meu coração começa a disparar, cada vez mais rápido, daria tudo para ter um lugar seguro para onde correr e me esconder e nunca mais ser encontrada. Me vejo em uma encruzilhada, ou ela vai me desmascarar na frente de todas ou vai morder a isca... Rezo que ela esteja na segunda opção. 

  Ágata me encara sorrindo, acho que suas bochechas estão a ponto de serem rasgadas. 

- Deixa eu te contar um segredinho - Ela aproxima seu rosto do meu o suficiente para que seu nariz fique a dois centímetros de distância - Aurora Richards está morta. - Ela se afasta encara o teto decrepito e grita - AURORA RICHARDS ESTÁ MORTA!! AURORA RICHARDS ESTA MORTA!! - Minha visão fica turva, lágrimas começam a rolar sobre meu rosto molhando minha roupa junto, tento segurar o riso, e as lágrimas continuam a escapar - Oh está chorando a borboleta! - Sinto os braços de Ágata sobre meu pescoço - Não fique triste borboleta preciosa não fique triste, logo você irá fazer companhia a sua querida Aurora no mundo dos mortos. - Ela continua repetindo isso no meu ouvido, mas não consigo prestar atenção em nada do que ela diz, mal sabe ela que as minhas lágrimas são de felicidade. 

     De novo sentadas perto do muro, de frente para a lixeira, Ashe está calada, continua observando a foto do jornal velho, Miranda está conversando com Érica do outro lado, estamos sozinhas, por enquanto. 

- O que você tem ? 

- Você não está morta.

 -Não. - Confirmo.

 - Então por que a bruxa disse que sim ? Por  que o jornal disse que sim ? 

- Ninguém quer saber isso mais do que eu.

- Você não está mentindo pra mim, está  ? 

- Não Ashe, eu não estou mentindo. 

- Eu posso te chamar de Aurora, quando estivermos mortas ? 
- Quem disse que vamos morrer ? 

- Todo mundo diz que vamos morrer. 

- Sim, iremos, mas antes vamos sair daqui, e quando isso acontecer vou te levar pra tomar um sorvete delicioso. -Vejo um sorriso lindo aparecendo no rosto dela, o sorriso de uma criança feliz, os dentes que faltam em sua boquinha deixam seu sorriso fofo, mesmo que ele esteja sujo, mas ela desmancha o sorriso e faz uma cara triste.

- Mas eu não tenho dinheiro pra comprar sorvete.

- E que tal eu pagar o seu ? Afinal sou eu quem estou convidando - Dou um sorriso para Ashe, ela me abraça. 

- Obrigada por aparecer, e por ser minha amiguinha, obrigada por você ser a Aurora.

- Não me agradeça - Deixo que Ashe permaneça sentada em meu colo, passo meus braços sobre ela e encaro o céu cinzento. A moça do jornal disse que eu havia assinado uma procuração deixando meus bens para meus tios... Mas eu nunca assinei isso, assinei apenas a procuração de seguro do meu tio. A procuração de seguro do meu tio... As peças do quebra cabeça começam a se encaixar e sinto como se tivesse levado um soco surpresa no estômago. Não era uma procuração de seguro de vida dele, mas meu. Agora entendo porque pude ir a casa de Margo aquele dia, agora sei como essa gente me encontrou. Olho para Ágata, ela esta sentada sob a mesa de cimento e está observando as menores. Eles sabiam onde eu estava, porque aquele maldito disse onde me encontrar, ele mandou sumirem comigo pra poder pegar meu dinheiro.


      Sempre soube que  Roberth nunca valeu nada, mas chegar ao ponto de tentar me matar pra conseguir dinheiro me fez ficar com ainda mais nojo dele, sinto as mãozinhas de Ashe em minha cintura, ela está me abraçando com força, involuntariamente, beijo sua cabecinha, olho para as outras meninas, penso em Margo machucada, Lauren deve ter adorado aquilo, penso em minha Tia Sara chorando, Roberth deve ter se deleitado ao ver a cena. Lauren famosa, Roberth com meu dinheiro, Brianna com uma dor de cabeça  a menos, aperto Ashe com força, sinto algo queimar dentro de mim, vai ter troco queridos Tios, estou voltando do mundo dos mortos  pra isso. 




 

sábado, 25 de julho de 2015

Capítulo 11 - Planos.

   
     Passo a noite analisando e repassando meu plano em minha  cabeça, Érica é alta o suficiente para servir de escada, mas andar pelas telhas sem sermos notadas é a parte mais complicada. Se este lugar for como dizem, então terão muitos homens com armas. Com cuidado, afasto a cabeça de Ashe da minha perna, e a encosto no chão, levanto-me e vou até onde Érica está deitada. Ela está dormindo,  consigo ouvir sua respiração pesada, parece pequeno roncos. 

- Érica -  Chamo baixinho e a sacudo para não acordar as outras, continuo balançando e chamando até que ela abra os olhos. 

- Que é ? 

- Eu, Luz. 

- O que você quer ? 

- Sei que você está chateada comigo pelo que fiz ontem mas.. 

- Já que já sabe, porque não volta a dormir ? - Me interrompe. 

- Porque preciso falar com você. 

- Eu não tenho nada pra falar com você.

- Sim, você tem, você tá louca para sair daqui, assim como eu. 

- Não se pode "sair daqui", estamos numa estrada sem retorno, uma vez que você é pega, nunca mais vai embora. 

- Eu discordo, precisamos reagir! Ou você quer ser vendida como um animal sem dono ? 

- Nós já somos animais sem dono, e já nos acostumamos com a ideia,  você pode fazer o mesmo ou levar tiros tentando escapar, a escolha é sua. 

- Eu achei que você fosse uma garota mais forte, mas pelo visto estou enganada. 

-Você só está aqui a um dia, não saia julgando quem não conhece - Érica me dá as costas e volta a deitar. Retorno ao meu cantinho perto de Ashe e me sento, encaro  as estrelas através do teto esburacado. A luz fraca que passa pela janelinha me permite ver a silhueta das outras garotas, não consigo fechar os olhos nem mesmo relaxar, preciso encontrar um meio de escapar daqui. Olho para onde Érica está deitada e vejo a silhueta de uma garota em pé, parece que ela está procurando alguma coisa, e a encontra encostada na parede. 

      A medida que ela se aproxima ajeito minha postura, não deixarei que ninguém mais encoste uma mão em mim. Pego meu sapato e o viro deixando o salto para cima. Ela tem cabelos médios e castanhos, uma pele bronzeada e veste uma calça jeans rasgada e uma blusa que um dia já foi verde. Ela senta ao meu lado e fica calada, depois do que parece ser uma eternidade decido quebrar o silêncio. 

- Também  veio me punir pelo que fiz no refeitório ? - Se é que dá pra chamar aquilo assim. 

- Mesmo que eu ache que foi idiotice da sua parte eu não vim até aqui pra isso,  você teve sorte de feito aquilo enquanto Ágata estava por perto, se fosse o Monstro você estaria perdida

- Quem é Monstro ?

 - O senhor gentil que  quase tirou metade do seu pescoço hoje de manhã. 

- Por que Monstro ? 

- É o que ele é, ele nos chama de monstros, uma vez quando uma das pequenas derrubou a tigela no refeitório ele a esmurrou até que ela desmaiasse, ninguém  nunca vai esquecer aquele dia. Depois de ter agredido a pequena, puxou Érica pelo cabelo e a levou. 

- Levou pra onde ? 

- Ninguém sabe, mas quando ela voltou, tinha marcas rochas no corpo e no rosto, e estava chorando muito, ela o chamou de monstro e todas nós percebemos que ele não apenas bateu nela. 

- Ele abusou dela, por que um acidente aconteceu com uma das menores? 

- Não só com menores, quando qualquer uma de nos fazemos algo de errado ou falamos no momento errado e ele está por perto, ele nos bate leva Érica. 

- Por que só ela ? 

- Ninguém sabe, mas suspeitamos que tenha sido por causa do cabelo. 

- Cabelo ? 

- O cabelo de dela era cacheado e longo, lindo, sempre que ele vinha buscá-la parte do cabelo era cortado, até ela ficar como está hoje - Olho para o corpo deitado de Érica, o cabelo curto estilo joãozinho com cachos que o levantam para cima, ela é mais forte do que parece. - Dias depois dele ter cortado o cabelo dela por completo, Ágata apareceu com uma peruca de cabelos cacheados,  por isso que a gente esconde o quanto pode, ela cortou o cabelo da Ana a duas semanas atrás. 

- quem é Ana ? 

- A garota que sempre anda com Érica, ela acha que são iguais devido ao corte de cabelo, mas quem pode culpá-la ? Só tem seis anos.

- Ninguém pode culpá-la. 

- Ouvi você falando sobre fugas com Érica. 

- Joguei a proposta, mas ela disse que já estávamos numa estrada sem retorno e que era melhor acostumar com a ideia  de ser vendida.

- Eu não quero passar o resto da minha vida deixando que homens se aproveitem de mim Luz. 

-Eu também não. 

- Todas nós estamos apavoradas, porque por mais que eu odeie esse lugar, eu não quero ir pra um lugar pior.

- Ninguém quer. 

- O que você pensou, para nos tirar daqui ? 

- Usar o teto - Digo, sinto minhas bochechas queimarem porque falando em voz alta, parece ser mais que uma ideia tola, que elas já devem ter usado. 

- E depois ?

- Sair correndo. 

- Me parece um bom plano, mas tem falhas. 

- Nunca tentaram usar o teto ? - Pergunto.

- Pra ser sincera não, eu sei que alguém já deve ter pensado nisso mas nunca disse em voz alta porque tem medo de ser ouvida e castigada.

- Quando fui falar com Érica, ela disse que eu tinha duas opções, levar tiros ou me acostumar com a ideia de ser vendida. Ela deve saber de alguma coisa, onde essas pessoas armadas ficam ou deve ter visto algum lugar que possa servir pra fugirmos. 

- Não acho que ela tenha visto algo assim, e se ela souber de algo,  nunca vai nos dizer. Como pretende chegar ao teto ? 

- Bem, eu ia pedir para a chefe me deixar subir em seus ombros. 

- Ela te daria um soco antes. 

- Eu aposto que sim - Concordo. 

- E a propósito, você pode me chamar de Miranda e é melhor você ficar longe da Vanily, a ouvi conversando com Ellie e Vanessa sobre você. Não eram coisas boas. 

- Com certeza ficarei. 

- Conte comigo pra qualquer coisa que  vá nos tirar daqui. - Miranda se levanta e volta para seu espaço no chão. Retirei todos os grampos e elásticos do meu cabelo e o prendi novamente, refazendo outro coque, mais resistente, e me deitei ao lado de Ashe que dormia tranquilamente.  Os dias foram passando e eu fui me apegando a rotina, de manhã Monstro nos acordava e fazia rodízio de seus assédios nojentos entre as meninas, semana passada ele cheirou e beijou o pescoço de Luana, de sete anos, aquela cena me deu um nojo profundo, ninguém podia fazer nada porque ele poderia fazer coisas piores como castigo, com  Luana ou com Érica.  Ágata nos observava enquanto estávamos no pátio e uma vez ou duas, uma mulher de cabelos pretos usando um óculos de sol e roupas caras nos observava pela janela do refeitório ela estava acompanhada de dois homens, um negro e outro com cabelos grisalhos. 

   Miranda passou a fazer companhia a mim e a Ashe, sempre que ela me chamava de Luz, Ashe dava um sorriso discreto. Érica parou de me bater, e Miranda me falava o que eu deveria ou não fazer. Nunca mais vi a TV ligada, não tinha com ter notícias dos meus tios ou de Otto. Ontem a noite tentamos chegar ao telhado, mas nem eu nem Miranda éramos  altas o suficiente. Minhas mãos não conseguiram alcançar as telhas. 

   Acordei antes de amanhecer, estava se tornando uma rotina, consegui pegar alguns papelões no lixo junto com Miranda e Ashe, deitar num papelão sujo é melhor que dormir no chão frio todos os dias. Ashe e Miranda ainda dormiam assim como todo o resto, e como sempre eu não conseguia fechar os olhos, minha atenção foi roubada por  soluços vindos do canto da parede oposta a que eu estava, vi uma pequena silhueta encolhida, de cabelos cacheados e calça rasgada, era Luana, e ela estava chorando. Levantei-me para ir a seu encontro mas Érica foi mais rápida, ela abraçou Luana e falou alguma coisa em seu ouvido que a fez sorrir, Érica permaneceu abraçada com ela até que dormisse. Sei que Érica passou o resto da noite acordada, assim como eu, ambas sabíamos uma da outra, mas não dissemos uma só palavra. 

   Sempre que Vanily acorda, ela reforça o rabo de cabalo e o enrola num coque parecido com o meu, me olha com os olhos negros e faz sinal para que eu acorde Ashe e Miranda, e eu obedeço. Em menos de sete minutos, todas as garotas já estão acordadas, a porta começa a fazer barulho e a maçaneta começa a se mover, um rangido e a porta é aberta. Monstro entra sorrindo como sempre, ele nos encara e eu olho para o chão como as outras fazem.

- De pé seus monstros! - Levantamos, as meninas formam um amontoado e eu, Ashe e Miranda corremos para perto do grupo, ele se aproxima e meu coração acelera, sua boca nojenta está com um sorriso largo e o cabelo preto seboso está brilhando, ele  está de preto, como sempre, e está cada vez mais próximo de mim, mas de repente ele para e se ajoelha na frente de Ana. Meu coração sobe a minha boca, por favor, ela não. Fico imóvel, se eu disser ou fizer algo ele pode estuprá-la ou alguma outra menina, quero correr e empurrá-lo e pisar em seus olhos com meus saltos, mas não posso, estão todas chocadas e enojadas ao mesmo tempo.    
   
    Monstro passa a mão na barriguinha de Ana e sorri, ele pega em seu cabelo com força e puxa sua cabeça para trás. 
   
    Ela chora, oh não, vejo as lágrimas escorrendo pelo rosto de Érica que mantém uma expressão de raiva. Monstro beija o pescoço de Anna e morde sua orelha com força fazendo-a gritar de dor.

- Não está gostando dos meus carinhos gatinha ? Eu vou te dar um ótimo motivo pra chorar. Monstro se levanta e tira o cinto, continua sorrindo, a pobre Anna está em pânico, todas estamos, e ele está rindo dela, ele coloca a mão na calça e a desabotoa.

- O que está fazendo ? - O homem negro que vi outro dia no refeitório aparece,  ele  entra no quarto e Monstro dá de ombros. 

- Roubando virtudes - Ele sorri, o homem pega o cinto do chão, e o dobra, da mesma maneira que tia Briana fazia para me bater. Ele observa o objeto de couro.

- Vai estuprar a menor ? 

- Ela tem que parar de ter medo - Monstro sorri, e o outro homem também sorri e dá uma gargalhada antes de meter o cinto com força na cara de Monstro que o encara abismado. 

- Longe das pequenas, os pais adotivos vão fazer exames nelas quando forem entregues, você não vai querer que descubram que elas foram violadas antes de chegarem na nova casa. 

- Não chefe - Monstro encara o chão e o homem da outro golpe com o cinto.

- Olhe pra mim quando falar - Ele joga o cinto no chão e vai em direção a porta - As leve  para tomar sol e vá pro escritório. A última coisa que queremos e que elas pareçam doentes no dia do leilão. - Ele sai e Monstro apanha seu acessório, Ana que continua chorando e corre até Érica que a põe nos braços e beija sua cabecinha, vamos para o pátio e Ágata aparece para nos fazer companhia como de rotina. 

    O dia passa rápido, e quando a velha Ágata nos tranca novamente, vou em direção ao meu papelão e deito-me, Ashe está conversando com Miranda e eu fecho os olhos, penso em Otto, eu deveria ter dito a ele sobre a surra e as brasas, se eu tivesse feito tudo diferente, poderia não estar aqui agora, poderia ter começando ouvindo Joana e nunca ter ido a casa de Margo. Sinto uma pontada nas costas.

- Tá acordada ? - Érica pergunta antes de eu sentir uma pontada mais forte. 

- Tô, mas não precisa me chutar pra perguntar. 

- Desculpe. 

-Não. 

- Faça o que quiser. 

- O que você quer ? 

- Vou direto ao ponto -  Olho para cima e todas as garotas estão a minha volta, para Érica e sua horda estarem me encarando, significa que fiz algo errado, oh não! Devem ter descoberto o jornal de Ashe com minha foto, meu coração acelera, vão me punir. 

- Semana passada você veio até a mim, de madrugada, me disse que deveríamos fugir, ou tentar. Me chamou de fraca e retornou ao seu lugar, desde então fica fuxicando com aquela suja - Érica aponta para Miranda que a lança um olhar perverso, sei que se ela tivesse uma pedra jogaria em Érica. - Sobre o que andam conversando ? 

- E de que isso importa ? - Pergunto - Afinal, você mesma quem me aconselhou a sentar e acostumar com a ideia de ser vendida. 

- Olhe ao seu redor patricinha, olhe essas meninas que não viram nada do mundo e não sabem o que é ser feliz. Você não acha que elas merecem pelo uma chance na vida? 

- Todas nós merecemos - Rebato.

- Ana tem seis anos e não sabe o que é um desenho animado e quase foi molestada nas nossas frentes, você não quer isso para Ashe ou pra qualquer uma de nós. 

- Você não sabe o que eu quero. 

- Sei que se não quisesse nos ajudar não teria ido atrás de mim. 

- O que você quer agora Érica?  Todas  já sabem que eu quero fugir, quer me mandar parar de fantasiar e dizer pra todas que não iremos a lugar algum ? Porque eu não vou vou fazer isso. 
 
- Não Luz, eu vim perguntar qual é o plano.  












terça-feira, 21 de julho de 2015

Capítulo 10 - Funerais e Cerimônias.

      
        Ashe continua olhando para minha foto no jornal e percebo que não tem somente uma folha em suas mãos.

     - Eu queria saber o que dizem essas letras - Ela faz uma carinha triste. - Será que ela vai adotar crianças que não tem família ?

   - Eu acho que isso seja um pouco difícil de acontecer.

   - Por quê ? 

   - Porque ela não tem idade pra adotar ninguém - Ashe volta a fazer biquinho e encara a foto, um sorriso surge em seu rosto como o sol saindo de detrás das nuvens - Você quer que eu leia o que está escrito ?

 - Você sabe ler ?

  - Digamos que sou ótima na arte da  leitura -  Sorrio, ela me entrega o jornal que surpreendentemente está completo.


  " Aurora Richards, Sequestrada e Assassinada." 


   Morre na tarde de ontem 15/06 Aurora Richards, filha de Heloise Richards e Benjamim Richards, a adolescente de dezessete anos foi sequestrada no dia 12/06 enquanto fazia  trabalhos escolares na casa de uma amiga, Margo Benson, que também desapareceu. Os sequestradores ligaram para os responsáveis legais de Aurora, seus tios Brianna e Roberth Barniel e exigiram cerca de dois milhões de dólares para a devolução da jovem, pago a quantia a família pedida,  seu tio encontrou o corpo dentro de um saco de lixo próximo a lixeira de um restaurante no centro. 

  " Foi horrível - conta o senhor Barniel - Me ligaram no escritório e me mandaram pegá-la num beco atrás de um restaurante, disseram que estaria deitada sobre o lixo e quando cheguei vi um saco negro enorme, estava chovendo muito e meu coração quase saiu pela boca, quando  abri o saco e vi o rosto da minha filha lá dentro e ela não respirava."

    A família muito abalada com tal violência levou o corpo para o hospital mais próximo, mas ela já estava morta e apresentava sinais de violência sexual. 

   Brianna Richards, tia da vítima, afirma que  a sobrinha foi vítima de uma vingança :

      "Os pais dela prendiam bandidos perigosos, eles vieram atrás de vingança e a mataram para dar o troco, nós nunca estaremos seguros, eu tenho uma filha de dezoito anos que agora é uma prisioneira da própria casa porque tem medo de sair na rua." 

   O enterro acontecera na próxima sexta, a cerimônia será realizada apenas para parentes mais próximos.  

" Eles vão pagar por cada lágrima que a fizeram derramar durante esses dias, vão pagar por ter apagado aquele sorriso"  - Postou Otto Brown em sua rede social confirmando o possível rumor de namoro entre eles. 

- Isso é mentira não é? Ela não pode estar morta. - Ashe toma o jornal de minhas mãos.

- Ela não está. 

- Então, por que as pessoas dizem que ela está ? 

- Porque alguém contou uma mentira muito muito feia e enganou todo mundo. 

- Ah, mentiras... - Ashe me encara, olha para a foto no jornal, ela volta a me encarar e olha para o jornal, em seguida sorri - Você é ela, não é ? 
 
Congelo.

- Você não pode contar pra ninguém ou eu e você estaremos muito, muito encrencadas entendeu ? - Vejo o sorriso de Ashe se tornar maior, os dentes que ainda sobraram estão corrompidos por cáries e estão meio quebrados, mesmo faltando alguns dentinhos é o sorriso mais bonito do mundo. Ela me abraça.

- Você veio me salvar não veio ? Você veio me levar embora assim como a sua mãe fez com a Sara. 

- Por favor, fala baixo - Imploro, não podemos chamar atenção das outras ou de qualquer um. 

- Falo, mas me promete que vai me salvar daqui ? - A encaro, ela é uma criança, não tem pais ou ninguém que se importe com ela, está sozinha contra um bando de bandidos e totalmente indefesa, assim como eu. 

- Eu prometo - Digo por fim. Somos interrompidas por uma voz feminina que chama nossa atenção, me viro e sua dona  está em cima da mesa de cimento onde as quatro menores estavam. Elas já não estão mais lá, percebo que correram até Érica do outro lado do pátio.

 - Bom dia meninas! Que lindo dia não? Espero que tenham dado as boas vindas a nossa mais nova integrante - Ela parece estar sorrindo, não tenho muita certeza, a luz do sol atrapalha minha visão - Não fiquem muito chateadas por ela ser mais bonita e sempre ter tido tudo que sempre quis, cada uma aqui dentro tem seu valor e nós reconhecemos o valor de cada uma de vocês mais do que ninguém, agora queridinhas vocês já sabem o que acontece : Fila indiana marchando para o refeitório.

- Aqui tem um refeitório ? - Olho para Ashe, ela aperta os olhinhos para tentar enxergar a mulher a nossa frente. 

- É uma sala grande que tem uma mesa grande e se você sentar na ponta dá pra ver a TV. - Antes de seguirmos as outras meninas e entrarmos na fila, corro até a poça de lama a minha frente, coloco minhas mãos dentro da gosma pastosa, prendo a respiração, levanto as mãos passo a lama sobre minhas bochechas. 

 - Por que você tá fazendo isso ? 

- Disfarce, pra ninguém me reconhecer. - Ashe olha para a poça de lama e corre até ela, passa a lama sobre as bochechas e em seguida me encara.

- Também to disfarçada - Ela sorri, seguro sua mão e vamos para a fila.

   A mulher que vista de perto usa uma peruca com cabelos negros chanel, e aparenta ter 50 anos anos de idade, sorri ao me ver e puxa meu braço me retirando da fila.

- Seja bem vinda ao nosso clubinho  preciosa, espero que esteja se misturando - Ela continua sorrindo, e eu a encaro, quero lembrar bem do rosto dela pra quando tiver que fazer seu retrato falado - Agora vá! Ande ou vai se atrasar pro café da manhã. - A minha frente Ashe junto com as outras meninas já se distanciam,  quando ela finalmente me solta saio correndo atrás da meninas que viram num corredor a esquerda e entram  numa sala que tem uma mesa grande e velha com madeira fofa, e um banco enorme. Os pratos já estão cheios, meios para ser exata, Ashe levanta a mãozinha e vou em sua direção.


- Guardei seu lugarzinho e veja, ela aponta para um janela semiaberta.- TV! - Sorri, olho para meu prato, um mingau branco chega até o meio, pego a colher e recolho um pouco da substância, e provo, o gosto é terrível, aposto que o fizeram com leite azedo. O cuspo de volta e Ashe me cutuca. 

- Você ta na TV - Olho em direção a janela e vejo a  
 "cerimônia fechada". O mesmo estádio onde comemoraram o aniversário de Jocelyn, ele estava lotado, um caixão negro no centro, um palco para a família. Corro em direção a janela, a câmera foca nas pessoas do palanque, vejo Lauren com um vestidinho preto e um par de óculos gigante, ela está abraçada a Jocelyn que chora na mesma intensidade, vejo tia Brianna secando o rosto com um lencinho Chanel e tio Roberth com um braço sob seus ombros a confortando, Tia Sara está com os braços cruzados, ela parece séria e inabalável, vejo Joana e Noan e meu coração dispara, Joana soluça sobre o peito de Noan que chora baixinho, vejo um rapaz alto usando um chapéu bibico ao seu lado, não pode ser, não pode ser, sinto minhas pernas tremerem quando a câmera chega perto do oficial, é ele!. Não sei que o acontece e minhas pernas se desmancham como se fossem feitas de açúcar, caio no chão fazendo barulho, sinto duas mãozinhas segurando meu braço, Ashe me olha espantada e me ajuda a levantar, ergo-me e me apoio na janela. Sim, é ele! Otto está lindo usando a farda negra com listras vermelhas nas laterais, algumas estrelas douradas no lado esquerdo do peito, chapéu branco e um par de óculos aviador, ele passa a mão sobre a bochecha, ele está chorando!! 

     Quero gritar, não sei se de emoção ou de tristeza por vê-lo naquele estado, a câmera se posiciona melhor  e o mostra por completo, ele está abraçando uma loira que parece o estar confortando. Ele foi com outra  no meu enterro! Mas que canalha!! Tento me manter calma mas minhas bochechas começam a arder, não sei se é de raiva ou de ódio, a câmera volta para o lado esquerdo onde Jocelyn e Lauren se abraçam e um rabo de cavalo vermelho ferrugem chama minha atenção, Margo! Margo está viva e está bem! Está chorando e está com Brian mas está bem, ela  usa um vestido preto acima dos joelhos e parece soluçar no peito de Brian que a beija carinhosamente na cabeça. Ah Margo, fico tão feliz por saber que você está segura. 

 - Esses são seus amigos ? - Olho para o lado e vejo Ashe na pontinhas dos pés e com as mãozinhas no batente da janela onde estou me apoiando, os olhinhos dela não conseguem ver muita coisa.

- Não - Digo tentando conter as lágrimas.

- Mocinhas, o que estão fazendo ai ? - A velha de cabelos curtos entra e fecha a janela - Já pra mesa, ou chamarei Tony para dar um bom corretivo em vocês. Ashe sai correndo em direção a mesa e volta a sentar-se em seu lugarzinho, as outras meninas estão observando - Sugiro que tenha muito cuidado senhorita, você acabou de chegar não vai querer arrumar confusão logo. E vamos comam rápido! Vocês precisam voltar para o sol e pegar uma corzinha, ninguém quer comprar franguinhos pálidos. - Ela bate palmas enquanto volto para meu assento. Ela continua sorrindo e batendo palmas quando todas as meninas terminam. 

- Ela é loca - Ashe fala encarando seu prato -  Todos os dias ela aparece com um cabelo diferente e fica rindo e batendo as mãos, as vezes ela fica com vontade de arrancar os cabelos da Amanda - Ela aponta para a garota negra de cabelos volumosos e cacheados, são cabelos bonitos, lindos o bastante para fazer uma peruca. 

- Ela já tentou cortar os seus ?  - Pergunto, Ashe segura algumas mechas do cabelo e continua olhando pra baixo. 

- Só no dia que você chegou. Ela ria e batia as mãos, dizia que ia ter novos cabelos e que dessa vez eles seriam grandes  - Olho para Ashe, ela parece aterrorizada, mas não acho que estavam falando dos cabelos dela. Pego as mechas que fogem do meu coque e as enrolo com o restante do cabelo, não vou deixar essa louca renovar meu corte. Deixo Ashe comer o meu mingau e a maníaca de peruca vem conferir se todas nós já comemos, voltamos em fila para o pátio e ficamos queimando no sol até anoitecer. 


   Quando o sol se põe o monstro  usando negro aparece na porta, as meninas começam a fazer a fila novamente e Ashe e eu as seguimos, as pequenas vão na frente, então Ashe se dirige para o começo da fila e eu sou a última, mas não por minha altura, Érica é maior de todas, eu apenas cheguei por último, fico atrás de uma menina com cabelos médios, estatura mediana, pele bronzeada, usando um rabo de cavalo e faz uma cara de poucos amigos, Érica está próxima as outras meninas, no começo da fila e elas começam a se movimentar. Assim que entro no cômodo que acordei e a porta de metal é fechada sinto uma dor pulsante no ouvido, minha cabeça começa a rodar. 

 - Você é retardada ? O que diabos tinha na cabeça ? - Érica estava na minha frente, ela deu um soco na minha orelha. 

- Você ta louca ? O que eu fiz ? - Pergunto indignada.

- O que você fez ? Você saiu correndo feito uma doente mental para ver TV! Se o monstro tivesse pego vocês duas todas nós iríamos  nos ferrar. 

- Eu não sabia que poderia prejudicar alguém, não era minha intenção. 

- Não foi o que pareceu, e você sua banguela irritante é melhor ficar longe daquela TV e do lixo ou não vai sobrar nem mais um dente na sua boca fui clara ? - Ouço Ashe começar a chorar baixinho, Érica volta para outro lado do quarto e se deita na cama de papelão, as outras meninas nos encaram feio depois nos dão as costas e iniciam uma conversa sussurrada entre  si. Pego na mão de Ashe e trago o paninho onde ela se deita para o local onde acordei quando cheguei aqui, a um metro de distância das outras, próximo a parede fria. Ashe se deita com a cabeça em minhas pernas e dá as costas para as outras meninas, faço no cabelo dela os mesmos movimentos que Joana fazia nos meus.
 
- Você  lembra dos seus pais ? - Pergunto, a respiração dela fica calma e ela para de chorar aos poucos.


- Não, mas eu lembro do meu irmãozinho.

- Você tem um irmão ?

- Tenho, ele era grandão, maior que a Érica.

- Você lembra o que aconteceu com ele ? 

- Não, só lembro que a gente tava na casa da minha vovó, Charles estava mimindo no chão do lado da minha cama, e escutei uns barulhos, ele levantou e colocou o lençol na minha cabeça mas eu tirei, então um pessoal de preto entraram e bateram muito nele e em mim e ai quando acordei eu tava aqui e o Charles tava sumido. 

- Você gostaria de ver o Charles novamente ? 

- As vezes eu sonho que ele vai chegar e vai bater em todo mundo, depois vamos voltar pra casa da vovó. 

- Vocês moravam com sua avó?  

- É - Olho para Ashe, ela está com os olhos fechados, sua respiração está lenta, por que o irmão dela a cobriu com um lençol ? E por que os pegaram dentro da casa deles ? O que será que fizeram com seu irmão ? Minha cabeça está latejando devido ao soco de Érica, minha mãe conseguiu tirar tia Sara de uma situação pior, olho a minha volta, doze garotas e um telhado quebrado...   Meu coração começa a bater mais forte, balanço Ashe para que ela abra os olhos.

- Eu vou tirar a gente daqui Ashe, eu prometo. Vejo o esboço de um sorriso em seu rosto. 

- Eu sabia - Ela diz antes de voltar a dormir.  












sábado, 18 de julho de 2015

Capítulo 9 - Brasas e Chicotes.





    - O que pretende dizer com isso ?. - Ele não responde, tira o celular do bolso e uma música que não reconheço começa a tocar, ela fala sobre alguém permanecer com alguém, Otto segura minha mão e a coloca sobre seu pescoço me puxando para mais perto, o volume do celular é alto o suficiente para a música fluir, sinto sua mão em meu quadril, encosto minha cabeça em seu peito e me perco nesse momento. Nossos corpos se movem no mesmo ritmo e ouço o coração dele batendo, está frio e ele me aperta, uma segunda música começa e continuamos no mesmo ritmo, essa é diferente, o homem que canta diz que tudo nele ama tudo nela, ouço a respiração lenta dele, a manga cumprida o protege do vento, sinto seus lábios tocarem minha cabeça.

- Por que tudo isso Otto ?  - Paro e o encaro, ele não está mais sorrindo.

- Não gostou de dançar comigo ? 

- Essa não é a questão. 

- Então qual é ? 

- Por que tudo isso ? Por que me trazer aqui ? Por que dançar comigo ? Por que me elogiar o tempo todo ?

- Eu só quero que saiba o quão bela está esta noite, quero tornar isso especial.

- Isso o que ? -  O encaro, ele olha nos meus olhos, os olhos dele são castanhos, mas aqui parecem negros, ele toca no meu queixo faz dois círculos utilizando o polegar antes de segurar com força e pressionar seus lábios contra os meus. Leve, molhado, macio, sinto-o puxando meu lábio inferior com os dentes antes de voltar a me beijar, no momento que reproduzo suas ações, lembro que nunca havia beijado um garoto na vida, começo a rir e ele se afasta. 

 - Fiz algo errado ? 

- Não - Respondo tentando me conter.

- O que é tão engraçado senhorita Richards ? 

- Nada. 

- Não acho que nada seja tão sem graça já que está tirando belos sorrisos.

- Só estou com vergonha - Coloco uma mecha do cabelo atrás da orelha. Ele deve estar me achando patética. 

- O que a deixa com tanta vergonha senhorita ? - Coro, não vou admitir isso na frente dele, não consigo olhar na cara dele então encaro minhas unhas - Acho que descobri o motivo. 

 - É uma opção de vida - Sinto minhas bochechas arderem.

 - Percebo - Otto segura meu maxilar novamente e me faz olhar em seus olhos - Ficarei feliz em ensiná-la como se faz.  - Ele se aproxima novamente, e sinto seus lábios, morde meu lábio inferior depois o beija, repete o processo com meu lábio superior e sua língua invade minha boca, e faço com ele os movimentos que ele fez comigo. 

- Você aprende rápido senhorita - Sussurra em meu ouvido antes de beijar-me novamente, de repente ouço um estouro no céu que me assusta, os fogos de artifício começam as estourar, de onde estou a o espetáculo é incrível.  Otto passa a mão por minha cintura e vejo a chuva de prata cobrir o céu, e como um raio, lembro de Lauren, já deve ser muito tarde, solto-me do braço dele.

- Preciso ir - Dou meia volta e avanço para os degraus.

- Mas por que a pressa ? 

- Minha prima deve estar me procurando - Ou fingindo que está. 

- Eu tenho quase certeza que não.

- Nos acreditamos naquilo que queremos.

- Aurora - Otto puxa meu braço novamente - Você não me deu o número do seu celular - Otto e eu trocamos os números de telefone e seguimos para o caos da festa de  Jocelyn que está com Lauren na porta que dá acesso as arquibancadas e vê quando eu e Otto nos aproximamos. 

   Jocelyn abre um sorriso enorme e percebo que ela trocou o vestido longo por um mais curto, Lauren me encara como se quisesse me explodir com o olhar. 

- Jocelyn querida, acho que está tarde, Aurora e eu precisamos ir.

- Mais já ? - Jocelyn faz cara de triste - Fique mais um pouco Aurora.

- Acho que minha prima  tem razão.

- Otto, faça Lauren mudar de ideia. 

- Acho que Lauren está certa Jocelyn, está tarde e não queremos que elas se metam em encrenca. Jocelyn faz um biquinho antes de se despedir de mim.

- Então até logo Aurora - Jocelyn me dá um beijo e um abraço, logo em seguida Otto vem me abraçar.

- Te chamo assim que chegar em casa - Ele sussurra e dou um breve sorriso para ele, Lauren também se despede e vamos para a recepção, ligo para Noan nos pegar no final do tapete vermelho e depois de outra chuva de flashes entramos no carro. 

- Puta - Lauren diz olhando pela janela.

- O que ? 

- Você.é.uma.puta. Quer que eu deixe mais claro ? 

- Eu não sou uma puta. 

- É claro que é! Sabia que eu estava a fim de Otto Brown e não demorou nem dois segundos a sós com ele pra chamá-lo  para ir pro escuro! - Fico chocada.

- Eu não sou uma puta e não o chamei para ir pra canto algum, ele queria me falar uma coisa - Minto, sei que se disser a verdade, tia Brianna vai me fazer dormir no lado de fora.

- E o que ele teria a dizer a alguém como você ?

- Ele veio me perguntar se você já estava comprometida, e se eu achava que ele tinha alguma chance com você. - Olho para o chão do carro, sei que vou pro inferno, mas pelo menos quero ter uma noite quentinha antes de ir. 

- E o que você disse ?

- Eu disse que a sua cor favorita era lilás, que você estava solteira e que gostava de rosas vermelhas, disse que você queria ser modelo e que gostava de diamantes. 

- Deu o número do meu celular ? 

- Não. 

- Você é uma inútil. 

- Eu não tenho o seu número, como iria dar algo que não possuo ? 

- Desse seu jeito, imprestável - Lauren me ignorou o restante da viagem, mas vi alguns sorrisos escapando de seu rosto, Noan me olhou pelo retrovisor e dei uma piscada com o olho esquerdo, vi seus olhos se apertando, ele sorriu pra mim. 

   Quando chegamos em casa, Lauren saiu na minha frente, e antes que eu abrisse a porta do carro Noan me chama.

- Como foi a festa senhorita ? 

- Melhor do que eu poderia imaginar Noan. 

- E isso é bom ? 

- Isso é espetacular, tenha ótimos sonhos Noan. 

- Durma com os anjos senhorita - Bato a porta e subo os degraus para porta principal, assim que entro na casa ouço Lauren chorando. Vou em direção a sala da lareira e a encontro no colo do Tio Roberth soluçando e tia Brianna estava em pé a olhando horrorizada. 

- Ela me humilhou papai! Na frente de todos, riu de mim e fez com que todos rissem e beijou Otto Brown de propósito! Só porque viu que ele estava me paquerando. 

- Isso é mentira! - Digo - Ela está mentindo, eu não o beijei e não a humilhei, apresentei-a ao governador, como você me mandou - Olho para tia Brianna.

- Vi você na arquibancada com ele! Não negue!

- Eu nego sim, Otto Brown Não me beijou!

- Ele beijou sim, e você só permitiu que ele o fizesse porque estava com inveja de mim! 

- É mentira! 

- Não é! - Ela encara tio Roberth - Jocelyn Brown ficou minha amiga porque ficou com pena de ver Aurora me maltratando - Lauren se levanta e fica de frente para tia Brianna - Ela disse que passávamos fome mamãe, que papai era um falido e que você fez um empréstimo para pagar esse vestido que estou usando - Ela passa a mão no rosto secando as lágrimas - O governador convidou a todos nós para irmos a festa mas ela não avisou a ninguém, porque não queria passar vergonha com a gente. - Tio Roberth me encara.

- Então é isso que sente por nós ? - Ele pergunta, parece enfurecido.

- Não, eu não disse essas coisas e não sabia que vocês também deveria ir!

- E claro que sabia, não finja! 

- Eu não sabia, eu juro. - Tio Roberth levanta e encara tia Brianna.

- E melhor cuidar disso, Lauren vá para o seu quarto.- Ele ordena antes de sair da sala e nos deixar a sós.

- Suba Lauren - Tia Brianna reforça - Preciso conversar com Aurora - Lauren e tio Roberth sobem as escadas, minha tia me dá as costas e pega algo ao lado da lareira - Me espere no seu quarto Aurora - Faço meu caminho para as escadas e entro no quarto, retiro o vestido e visto um shorts azul e uma camiseta preta e a espero. Quando ela finalmente chega está segurando uma pá com brasas e um sinto preto do meu tio. Ela derrama as brasas da pá no canto da parede e as espalha bem até que estejam por todo o local. 

- Retire a blusa e ajoelhe-se.

- O que ? - Tremo, ela não pode estar falando sério - Olho para o chicote em suas mãos e para as brasas ao lado.

- Eu mandei você retirar a blusa e se ajoelhar, AGORA - Ela grita e eu a obedeço. Jogo o paninho que cobria meu corpo em cima da cama e me ajoelho ao seu lado - Nas brasas, quero você em cima das brasas - Lágrimas começam a escorrer dos meus olhos, não consigo me mover, o pânico me domina, ela puxa meu braço com força me obrigando a levantar, tropeço em meus pés, minha tia me empurra contra as brasas e caio de joelhos, grito, elas estão queimando meus joelhos e derretendo minha pele, a dor é tão forte que não consigo me segurar, e de repente sinto uma chicotada nas minhas costas roubando-me outro grito, e mais outra, e mais outra, minhas costas começam a arder e a latejar.

- Por favor! - Suplico, mas elas não para, mais uma, e outra, não consigo me controlar a dor e tão forte quee deixo mais gritos escaparem, coloco minha mãos nas paredes e sinto o cinto cortando minha pele com mais intensidade, solto um berro. Ouço vozes do outro lado da porta Joana está batendo, mas não está só, Natalie e Susi as outras empregadas, estão com ela. 

- Senhora! Senhora por favor! Pare Senhora! - Mais golpes, quase esqueço as brasas sob meus joelhos, minhas costas latejam, ela puxa meu cabelo e caio no chão longe das brasas.

- Que essa seja a primeira e última vez que você fala com Otto Brown ou qualquer um daquela família. Que seja a última vez que humilha a minha filha porque se acontecer de novo, vai ser bem pior pra você. - Tia Brianna sai do quarto e Joana entra correndo até mim, não consigo mexer meu corpo, estou latejando de dor, e não consigo fazer com que as lágrimas cessem. 

     Joana manda Natalie pegar alguma coisa na cozinha, Susi forra  meu edredom no chão e me vira com cuidado, quando Natalie chega, sinto seus dedos finos  passando algo que arde sob minhas costas, Susi pega a mesma gosma e passa sob meu joelhos, enquanto Joana seca minhas lágrimas e acaricia meu cabelo, não consigo parar de tremer.

- Já passou querida, vai ficar tudo bem agora - Meu corpo arde, meus joelhos ardem, minha cabeça dá voltas e voltas, e não controlo os tremores que passeiam por meu corpo.         
       Sinto as mãos de Joana em meus cabelos e me concentro nelas, minha visão fica pesada e aos poucos me entrego a escuridão. Quando acordo estou de barriga para baixo na minha cama, meu dorso ainda dói, e mesmo que seja pouco, sinto meus joelhos doloridos, Joana está sentada ao lado de minha cama, pela aparência ela não dormiu.

- Como se sente querida ? 

- Péssima. 

- Escutei gritos ontem a noite, todos a ouvimos gritar, então quando cheguei a porta estava trancada, desculpe-me por ter chegado tão tarde. 

- Não peça desculpas, você veio e ficou comigo, não pode se desculpar por nada. - Vejo lágrimas se formando nos olhos dela - Não chora, por favor, ou vou me sentir pior do que já estou.

- Me desculpe querida - Joana limpa os olhos - Já passou.

- Passou a noite toda nessa cadeira ? - Observo, ela me lança um sorriso triste.

- Não queríamos correr o risco de deixá-la sozinha, então dormimos aqui. 

- Dormimos ? Quem mais está aqui Joana ?.

- Susi e Natalie senhorita -  Natalie aparece e segura minha mão,  tento fazer carinho em sua mão e repito o gesto com Susi, não demora muito para que elas voltem a seus afazeres. - Passarei o dia com você senhorita. 

- Não é necessário Joana, por favor, não quero que se encrenque por minha culpa.

- Não irei senhorita, não se preocupe. Quer me contar como foi a festa ontem ? - Ela tenta sorrir, demonstrar que está tudo bem, mas não está. 

- Eu beijei um garoto Joana - Sinto as lágrimas fugindo novamente - Um garoto lindo, que me tratou como uma princesa. 

- Ah! Querida isso é maravilhoso!

- Seria se eu não tivesse apanhando para nunca mais falar com ele. 

- Foi por isso que ela a agrediu ? Por causa de um beijo?

- Não foi qualquer beijo Joana, eu beijei o filho do governador, que por conhecidencia Lauren estava flertando. 

- Oh querida, isso é ruim. 

- É péssimo. - Deixo as lágrimas escorrerem e ouço meu celular vibrando em cima do birô, Joana o pega e  me entrega, ela me ajuda a sentar na cama e quando pego o aparelho, vejo dois e-mails de Otto. 

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 De: Otto Brown
Para: Aurora Richards
Assunto: Nuvens e Fronteiras.

Bom dia Srta. sei que está um pouco cedo, mas gostaria de convidá-la para almoçar no sábado. Se dependesse de mim, a veria hoje mesmo, mas preciso trabalhar, devo estar de volta no final de semana, acha que sou digno de sua presença ?

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De: Otto Brown
Para: Aurora Richards
Assunto: Aluna Dedicada. 

Minha irmã disse que você gosta de ler. Tenho alguns livros que acho que você pode gostar. Um deles, fala sobre um oceano particular ;D. 

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     Desligo o celular e o jogo contra a parede, a última coisa que preciso agora e de Otto ou dos seus livros. Joana fica comigo durante todo o dia, ela liga a TV e me faz companhia.  Ela passa por um canal de fofoca, minha foto está ao fundo, ela aumenta o volume e ouve o que a moça com descendência indiana falar. 

" Quem chamou a atenção na noite de ontem foi Aurora Richards, que compareceu ao aniversário da filha do governador Benedit Brown, usando D'obrey coberto por cristais, vestido avaliado em 700 mil euros, mas tanto glamour corre o risco de ser ofuscado, a adolescente de dezessete anos foi para casa as duas e meia da madrugada,  ao que parece a justiça foi acionada e assistentes sociais já foram conferir a vida pessoal e a falta de limites que seus responsáveis a proporcionam..."  - Joana desliga a TV sem que a reportagem acabasse.  

- Não precisamos de mais dores de cabeça não é mesmo ? - Ela sorri. Nos dias que seguiram me comuniquei apenas uma vez com Otto,  respondi que não poderíamos mais nos ver, que arrumei encrencas o suficientes para um século, e ele era velho de mais para mim. Quase sempre deixava o celular no silencioso, ele ligava  quase todos os dias durante seis meses e de repente parou. Acho que se cansou de me procurar. Sempre que chegava algum convite para festas ou eventos, tia Brianna o jogava, quando as senhas não vinham com meu nome, dava para Lauren ir com alguma amiga. 

        E eu fui proibida de sair, tanto pela encrenca com o conselho tutelar, quanto pelo que aconteceu na festa de Jocelyn.

- Ela é muito linda não é mesmo ? - Ashe me encara, me trazendo de volta  para o agora.

- Ela é sim. - Concordo, Ashe continua sorrindo e olhando para minha foto, acho que deveria contar a verdade para ela.



Leia o Primeiro Capítulo.

Capítulo 1. Uma Face Conhecida.

        Há alguns anos o país de Lori conheceu a história de uma amizade verdadeira. Graças a coragem de uma garota de dezesseis anos, outr...